Novidades na legislação vigente sobre igualdade salarial.
A pauta da igualdade salarial desafia legisladores, juristas e gestores há algum tempo.
Apesar de ser um ponto já regulamentado, reforçado em discussões de direitos humano, nos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU – e em vários movimentos sociais, ainda é um grande problema implementar e monitorar, na prática, se de fato as organizações tratam, de forma equivalente, em seus planos de cargos e salários, as pessoas de diferentes gêneros.
A dificuldade se deve a estratégias usadas ao longo do tempo para simular o atendimento a esta regra. Cargos tinham nomes distintos apesar de terem as mesmas funções atribuídas, questões de ordem pessoal e familiar sobrestavam qualidades curriculares e profissionais durante processos seletivos.
Tais estratégias inviabilizam o monitoramento e a avaliação adequada das informações sobre a igualdade no tratamento de empregados e empregadas.
Para reforçar o controle sobre práticas discriminativas e promover a igualdade salarial, normativas recentes foram estabelecidas. Entre elas, a Lei 14457/2022, que introduz o programa Emprega + Mulher, e a Lei 14611/2023 juntamente com o Decreto 11795/2023, que orientam a elaboração de relatórios de transparência salarial. Estas normas buscam assegurar a igualdade salarial por meio da implementação de relatórios detalhados e planos de intervenção para corrigir eventuais discrepâncias identificadas.
Abaixo, faço um overview sobre as normas que uma organização que preza pela implementação de uma governança alinhada com métricas ESG e os ODS deve observar. Vamos prosseguir?
Lei 14457/2022
Esta lei trata do Emprega + Mulheres e dispõe sobre a relevância do apoio à parentalidade por meio da flexibilização do regime de trabalho.
Dentre as formas de apoio, podemos mencionar que:
- os empregadores deverão conferir prioridade na alocação de vagas para as atividades que possam ser efetuadas por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância às empregadas e aos empregados com filho, enteado ou criança sob guarda judicial com até 6 anos de idade; e às empregadas e aos empregados com filho, enteado ou pessoa sob guarda judicial com deficiência, sem limite de idade.
- os empregadores, considerada a vontade expressa dos empregados e das empregadas que tenham filho, enteado ou pessoa sob sua guarda com até 6 anos de idade ou com deficiência, pode priorizar a concessão de uma ou mais medidas de flexibilização da jornada de trabalho como regime de tempo especial, antecipação das férias, horários de entrada e saída flexíveis.
Há ainda um capítulo sobre a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho de pais empregados, a fim de contribuir para o estreitamento de vínculos familiares e promoção do cuidado.
Nesta norma formas de incentivar a qualificação das mulheres são tratadas. As mulheres podem requerer, formalmente, o acesso a tais incentivos como a suspensão do contrato de trabalho, cursos em áreas que promovam a ascensão profissional ou em áreas com baixa participação feminina, bolsa de qualificação profissional e ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial.
As empresas que se destacarem em práticas como estas, podem receber o Selo Emprega + Mulher.
Lei 14611/2023 e o Decreto 11795/2023
A Lei 14611/2023 trata da igualdade salarial e dos critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função. Para tanto ela propõe mudanças na CLT no que diz respeito ao tema.
São acrescidos artigos sobre da discriminação por motivo de sexo, raça, etnia, origem ou idade. Estes, além de poderem receber o pagamento das diferenças salariais devidas em razão de discriminatório, podem ingressar com ação de indenização por danos morais. O empregador terá que pagar também uma multa10 vezes o valor do novo salário, elevada ao dobro, no caso de reincidência.
Quanto à igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, a norma define as seguintes medidas:
- estabelecimento de mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios;
- incremento da fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens;
- disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial;
- promoção e implementação de programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho que abranjam a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema da igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, com aferição de resultados; e
- fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens.
Todos essas medidas são diretamente relacionadas à governança empresarial e a planos de cargos e salários comprometidos com seus stakeholders. Assim é fundamental que as organizações diversifiquem sua tomada de decisão, seus conselhos e políticas de integridade.
Para instrumentalizar estas práticas, a norma determina a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas pessoas jurídicas de direito privado com 100 (cem) ou mais empregados. O Decreto 11795/2023 regulamenta como deve ser o relatório.
O Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios tem por finalidade a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos. Este deve ter as seguintes informações:
- o cargo ou a ocupação contida na Classificação Brasileira de Ocupações – CBO, com as respectivas atribuições; e
- o valor do salário contratual; do décimo terceiro salário; das gratificações; das comissões; das horas extras; dos adicionais noturno, de insalubridade, de penosidade, de periculosidade, dentre outros; do terço de férias; do aviso prévio trabalhado; relativo ao descanso semanal remunerado; das gorjetas; e relativo às demais parcelas que, por força de lei ou norma coletiva de trabalho, componham a remuneração do trabalhador.
Prezando pelo cumprimento da LGPD, os dados e as informações constantes dos Relatórios deverão ser anonimizados.
O Relatório deve ser divulgado, na internet, pela empresa, seja pelo seu site e/ou redes sociais, garantindo amplo acesso às informações nele prestadas. Além disso, este deve ser postado na plataforma indicada pelo MTE, portal Emprega Brasil, nos meses de março e setembro.
Caso seja identificada qualquer situação que indique discrepância nos salários, a empresa deve elaborar um Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens.
Esse Plano deve ser claro e objetivo, evidenciando, de forma prática, as medidas a serem adotadas, as metas e os prazos. A fim de alcançar o esperado, devem ser criados programas relacionados à capacitação de gestores, lideranças e empregados a respeito do tema da igualdade entre mulheres e homens no mercado de trabalho. Assim todos se informam sobre o tema, estabelecem fluxos novos e se responsabilizam pela igualdade.
Deve haver também um plano para a promoção da diversidade e inclusão no ambiente de trabalho e para a capacitação e formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens. Importante que as capacitações, assim como descrito no Emprega + Mulheres, possam realmente garantir às mulheres progressão na carreira.
Para atingir tais objetivos, os planos devem ser construídos de forma conjunta, envolvendo representantes das entidades sindicais e dos empregados. A empresa que tiver entre cem e duzentos empregados pode promover procedimento eleitoral específico para instituir uma comissão que garanta a participação efetiva de representantes dos empregados.
Em caso de descumprimento desta obrigação, será aplicada multa administrativa cujo valor corresponderá a até 3% da folha de salários do empregador, limitado a 100 salários-mínimos, sem prejuízo das sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens.
Checklist para avaliação da conformidade com a Igualdade Salarial
Diante destas normas, é essencial que as organizações revejam seus planos de cargos e salários, avaliem suas políticas de integridade e remuneratória e preparem suas equipes de RH e lideranças, para que todos esses estejam alinhados com práticas de tratamento igualitário entre a equipe de trabalho e nos processos de seleção.
Para tanto é importante estarem atentos aos seguintes requisitos:
- A organização implementa e fiscaliza o cumprimento de uma política remuneratória que impede discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens?
- A organização promove e implementa programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho que abranjam a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema da igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, com aferição de resultados?
- A organização fomenta a capacitação e a formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens?
- São publicados semestralmente (Meses de março e setembro) relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais empregados?
- Quando identificada situação de desigualdade salarial ou de critérios remuneratórios, a pessoa jurídica de direito privado apresenta e implementa plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho?
As empresas podem ainda buscar um entendimento mais completo relacionando esses pontos com outras métricas ESG. Nesse sentido, a Plataforma Qualifica NG pode ser um aliado estratégico, pois ele permite o monitoramento e a conformidade com as legislações vigentes, além de possibilitar a análise e a integração de outras métricas ESG relacionadas à governança, à saúde e à segurança no trabalho.
Igualdade Salarial: desafios e avanços para o cumprimento dos requisitos legais
Com as recentes normativas sobre Igualdade salarial, as organizações enfrentam o desafio de revisar e adaptar suas políticas remuneratórias e práticas de transparência. Essa mudança legislativa não apenas pressiona por uma adequação às novas regras, mas também impulsiona uma reflexão mais ampla sobre a cultura corporativa e o compromisso com práticas sustentáveis.
A tarefa de alinhar as operações internas com essas expectativas legais e éticas exige uma abordagem meticulosa em que a precisão na coleta e na análise de dados se torna um pilar central. Este esforço representa um passo decisivo na direção de um ambiente corporativo no qual a igualdade é não só valorizada, mas efetivamente praticada.
Neste contexto, o entendimento aprofundado sobre relatórios de sustentabilidade assume um papel importante já que esses documentos podem ser primordiais para mapear o progresso e demonstrar a conformidade tanto em termos de regulamentações como parte de um compromisso mais amplo com a responsabilidade corporativa.
Por isso, para finalizar, compartilho com você o artigo Relatório de Sustentabilidade: Qual modelo escolher e como a conformidade legal pode ajudar a organizá-los. Ele oferece informações relevantes como os vários modelos de relatos, abrangendo desde o Relatório de Sustentabilidade GRI – Global Reporting Initiative até o ESRS – European Sustainability Reporting Standards, e como escolher o melhor modelo para os objetivos da sua empresa. Para ler o artigo, basta CLICAR AQUI.