Princípio da Prevenção no Direito Ambiental é essencial para o desenvolvimento econômico sustentável e responsável.
O Direito Ambiental, essencial na salvaguarda do meio ambiente, visa proteger o meio ambiente e garantir o seu uso sustentável. E é nesse contexto que vamos nos concentrar para tratar neste artigo de um de seus princípios fundamentais: o Princípio da Prevenção que orienta as ações dos agentes públicos e privados.
A natureza do Princípio da Prevenção
Este princípio, fundamental no Direito Ambiental, postula que atividades com potencial poluidor ou degradador devem ser geridas proativamente para evitar danos ambientais. Ou seja, é melhor prevenir do que remediar. Essa nova perspectiva traz a ideia de preservação da natureza não só para a geração atual, mas também para as gerações futuras.
Baseia-se na premissa de que prevenir é mais eficaz e economicamente viável do que remediar. Reconhecendo que os danos ambientais podem ser irreparáveis ou de difícil reparação, o princípio da prevenção enfatiza a importância de ações antecipatórias.
O princípio da prevenção também está relacionado ao conceito de precaução, que se aplica aos casos em que há incerteza científica sobre os possíveis impactos ambientais de uma atividade. Nesses casos, deve-se adotar medidas cautelares para evitar ou reduzir os riscos de danos graves ou irreparáveis ao meio ambiente.
Para prosseguirmos, nada melhor do que entender como esse princípio surgiu e o que como ele está previsto na Constituição do nosso país.
Origens do Princípio da Prevenção
Com suas raízes no direito internacional, o princípio da prevenção é reconhecido em diversos tratados e declarações sobre o meio ambiente, como a Declaração de Estocolmo de 1972, Convenção de Viena de 1985, Declaração do Rio de 1992.
Desde a Proclamação da República, o Brasil contou com 7 Constituições. A única que trouxe uma tratativa bem definida e deu a maior importância as questões foi a Constituição de 1988. Conhecida como constituição cidadã, a Carta Magna de 1988 é considerada também um marco por incorporar este princípio ao dedicar um capítulo exclusivo ao meio ambiente e reconhecendo-o como um bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida.
O Artigo 225 da Constituição é claro ao afirmar o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo responsabilidades ao Poder Público e à sociedade para sua defesa e preservação. Este artigo especifica ações como a preservação dos processos ecológicos, a diversidade genética, e a exigência de estudos de impacto ambiental para atividades potencialmente degradadoras.
O artigo 225 da Constituição estabelece que:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
O parágrafo primeiro do mesmo artigo determina que para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Além da Constituição, o princípio da prevenção também está presente em diversas leis e normas infraconstitucionais, como a Lei nº 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, e a Lei nº 9.605/1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
O Princípio da Prevenção na prática: estudos de impacto ambiental
O princípio da prevenção implica em uma série de obrigações e responsabilidades para os agentes públicos e privados que realizam ou autorizam atividades potencialmente poluidoras ou degradadoras do meio ambiente. Nesta altura, já sabemos que não podemos cair na ingenuidade de crer que existe “fórmula mágica” que demonstre quais ações geram riscos.
Portanto, é importante que as empresas realizem os estudos de impacto ambiental. Esses estudos serão capazes de revelar os reais riscos do empreendimento e quais ações e investimentos são necessários para mitigá-los.
Dessa forma, podemos dizer que uma das principais aplicações do princípio da prevenção é a exigência de estudos e relatórios de impacto ambiental para a instalação de obras ou atividades que possam causar significativa degradação do meio ambiente.
Esses estudos devem avaliar os possíveis efeitos da atividade sobre o meio ambiente, bem como as medidas mitigadoras e compensatórias necessárias para evitar ou reduzir os danos. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) é acompanhado do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).
O EIA/RIMA é diretamente atrelado às concessões de autorizações e licenças, visto que o objetivo do estudo é antecipar os impactos que podem acontecer a partir da operação do empreendimento. Em linhas gerais, o EIA é a demonstração dos estudos técnicos realizados.
As principais finalidades do EIA são:
- Realizar o diagnóstico ambiental da área que será abrangida. • Definir o tratamento dos efeitos negativos gerados pelo empreendimento.
- Estabelecer um programa de monitoramento e acompanhamento do andamento do empreendimento.
Um dos componentes essenciais do EIA é a análise dos impactos ambientais do projeto e a verificação de sua importância e prováveis prejuízos à natureza.
É importante destacar que o princípio da prevenção está intimamente ligado a essa análise. Um ponto fundamental do estudo é demonstrar, com clareza, cada risco que a intervenção possa trazer. Isso porque um alto risco de dano, já mapeado desde a realização do EIA, inviabilizaria a sua realização.
Já o RIMA apresenta o que os estudos concluíram. Sua linguagem é menos técnica e serve para que todos os interessados tenham acesso facilitado ao estudo.
Outra aplicação do princípio da prevenção é a adoção de medidas de controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras ou degradadoras, como o licenciamento ambiental, o monitoramento da qualidade ambiental, a imposição de padrões de emissão e de qualidade, a aplicação de sanções administrativas, civis e penais, entre outras.
E cabe acrescentar que o princípio da prevenção também implica na responsabilidade objetiva dos agentes que causam danos ao meio ambiente, independentemente de culpa ou dolo. Isso significa que o poluidor deve reparar integralmente os danos causados, sem que seja necessário provar a sua intenção ou negligência.
Aplicação prática no setor industrial
No setor industrial, o princípio da prevenção traduz-se na adoção de práticas sustentáveis, que vão desde o planejamento e design de produtos e processos até a gestão de resíduos e emissões. Empresas são instadas a identificar potenciais riscos ambientais de suas operações e a implementar medidas para mitigá-los antes que causem danos. Isso pode incluir a adoção de tecnologias mais limpas, a realização de auditorias ambientais regulares e a promoção de uma cultura de responsabilidade ambiental entre os colaboradores.
Além do mais, na avaliação de riscos, é importante considerar quais deles devem ser eliminados ou gerenciados. Essa análise envolve avaliar a severidade do risco, a extensão dos danos potenciais e a aceitabilidade dos riscos do ponto de vista financeiro. Essa abordagem não apenas assegura a proteção ambiental, mas também ajuda a manter uma imagem corporativa positiva, equilibrando os aspectos ambientais e financeiros na gestão de riscos.
Prevenção e Precaução: uma distinção necessária
Embora tenham semelhança semântica e sejam, frequentemente, usados de forma intercambiável, os princípios da prevenção e da precaução abordam diferentes aspectos da gestão de riscos ambientais. A principal diferença entre eles é o grau de certeza científica sobre os impactos ambientais de uma atividade.
O princípio da prevenção se aplica aos casos em que há uma certeza ou uma probabilidade razoável de que uma atividade causará danos ao meio ambiente. Nesses casos, deve-se evitar ou minimizar os danos antes que eles ocorram, com base em evidências científicas e técnicas.
Já o princípio da precaução está expresso na Declaração de Princípios sobre Florestas e a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, mais especificamente no Princípio 15:
“Com a finalidade de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para que seja adiada a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação ambiental.”
O princípio da precaução se aplica aos casos em que há uma incerteza ou uma controvérsia científica sobre os possíveis impactos ambientais de uma atividade. Podemos dizer então que o princípio da precaução antecede a prevenção. Nesse princípio, o risco de dano que ainda não está comprovado cientificamente deve ser evitado. A aplicação da precaução visa uma ampla proteção, até que se possa avaliar eventuais riscos.
Nesses casos, deve-se adotar medidas cautelares para evitar ou reduzir os riscos de danos graves ou irreparáveis ao meio ambiente, mesmo que não haja evidências científicas conclusivas.
Um exemplo de aplicação do princípio da prevenção é a exigência de estudos de impacto ambiental para a instalação de empreendimentos cujos efeitos sobre o meio ambiente sejam conhecidos e mensuráveis.
Um exemplo de aplicação do princípio da precaução é a proibição ou a restrição do uso, por exemplo, de organismos geneticamente modificados, cujos efeitos sobre o meio ambiente são incertos ou controversos.
Em outras palavras, podemos afirmar que os princípios da precaução e da prevenção andam juntos no direito ambiental. Para não perdermos o fio da meada, vamos lembrar: o risco que pode ser medido deve ser evitado e aquele que não se pode medir, deve ser imediatamente descartado.
Toda essa conjuntura de fatores leva à manutenção do equilíbrio ambiental e a sua continuidade no tempo.
Essas definições podem nos conduzir a uma dúvida: Como a ausência de certeza científica afeta a responsabilidade de prevenir danos ambientais?
Certeza científica e recuperação pelo dano
Para avançarmos com esse esclarecimento, vamos partir de que, muitas vezes, equivocadamente, pessoas e organizações podem achar que, por vezes, ignorar o risco gera um custo muito menor. Mas depois do que já conversamos até agora, fica claro que “essa economia pode sair muito caro”. Assim, podemos prosseguir, ampliando esse entendimento:
A ausência de certeza científica não deve ser vista como um obstáculo à ação preventiva no âmbito do direito ambiental. Pelo contrário, este princípio sublinha a importância de adotar medidas de precaução e prevenção diante da incerteza, a fim de proteger o meio ambiente contra possíveis danos irreparáveis.
A responsabilidade de prevenir danos ambientais recai sobre todos os atores sociais, especialmente sobre aqueles que detêm o poder de causar impactos significativos, como grandes corporações e entidades governamentais.
A ausência de certeza científica também não impede a aplicação do princípio do poluidor-pagador, que estabelece que o poluidor deve arcar com os custos da prevenção, do controle e da reparação dos danos ambientais. Isso significa que o agente que realiza ou autoriza uma atividade potencialmente poluidora ou degradadora deve assumir os riscos e as consequências de sua ação, mesmo que não se tenha estabelecido uma certeza sobre os seus efeitos.
A legislação ambiental brasileira, inspirada em tratados internacionais e na evolução das práticas de sustentabilidade globais, enfatiza que a falta de conhecimento completo sobre os potenciais impactos ambientais de uma atividade não isenta seus responsáveis das obrigações de mitigar riscos ambientais. Esse enfoque proativo é essencial para a manutenção da integridade ecológica e para a promoção do desenvolvimento sustentável.
O princípio da prevenção é, portanto, um instrumento jurídico fundamental para a proteção do meio ambiente e para a promoção do desenvolvimento sustentável, que busca conciliar o progresso econômico e social com a preservação dos recursos naturais.
Integração com outras normativas e políticas
A aplicação efetiva do Princípio da Prevenção requer sua integração com uma ampla gama de políticas e normativas ambientais. Isso inclui regulamentações sobre uso da terra, gestão de recursos hídricos, controle da poluição, conservação da biodiversidade, gestão de resíduos, regulamentações sobre o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), que prevê a compra e venda de créditos de carbono entre outras. A sinergia entre diferentes instrumentos legais e políticos é fundamental para criar um framework robusto que apoie decisões sustentáveis e preventivas.
Sendo assim, já podemos deixar em relevo que as regulações em torno dessa temática se movem com dinamismo e, por isso, muitas normativas seguem sendo publicadas e, ainda, há o porvir. É fundamental acompanhar esse movimento, entender as mudanças e, principalmente, valer-se delas como oportunidade para desenvolvimento. Trago aqui uma fala do Walter Cerqueira: “é imperativo rever como alimentamos nossos dias, nossas ações, e buscar com coragem redobrada, novas formas para se garantir a sustentabilidade num mundo complexo e dinâmico.”
Desafios e perspectivas futuras
A implementação do princípio da prevenção enfrenta diversos desafios, desde a resistência de setores econômicos até a necessidade de maior conscientização pública sobre questões ambientais. Além disso, a evolução constante das tecnologias e dos padrões de consumo exige uma atualização contínua das legislações e das práticas de gestão ambiental.
Para superar esses obstáculos, é essencial promover a educação ambiental, fortalecer os mecanismos de fiscalização e incentivar a participação pública nas decisões ambientais.
Outro aspecto importante é a cooperação internacional e o intercâmbio de melhores práticas podem acelerar o progresso em direção a uma gestão ambiental mais eficiente e preventiva.
Caução Ambiental e o Princípio da Prevenção.
Depois de discutirmos os desafios e as perspectivas futuras para a implementação do princípio da prevenção, vamos conhecer uma inovação que já traz alguma sinalização para o futuro das regulações que se apoiarão nesse princípio.
Estamos falando da caução ambiental, uma garantia financeira que visa assegurar o cumprimento das obrigações ambientais por parte dos agentes que realizam atividades potencialmente poluidoras ou degradadoras do meio ambiente. Ela é uma tendência mundial, já adotada em diversos países, como a França, a Espanha, a Alemanha, o Canadá, a Austrália, entre outros.
A caução ambiental pode estar relacionada tanto ao Princípio da Prevenção quanto ao Princípio da Precaução, dependendo do contexto.
Já vimos que o Princípio da Prevenção é aplicado quando os impactos ambientais são conhecidos e previsíveis. Ele impõe medidas acautelatórias para atividades cujos riscos são conhecidos. Por outro lado, o Princípio da Precaução é aplicado quando os riscos são desconhecidos e imprevisíveis. Ele impõe um comportamento mais restritivo à Administração Pública quanto às atribuições de fiscalização e de licenciamento das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.
Portanto, a caução ambiental, como uma garantia financeira exigida para assegurar a recuperação de possíveis danos ambientais, pode estar relacionada ao Princípio da Prevenção quando os riscos são conhecidos. No entanto, quando há incerteza sobre os riscos, a caução ambiental pode estar mais alinhada ao Princípio da Precaução.
No Brasil, o estado de Minas Gerais já conta com regulações a esse respeito. O Decreto Estadual MG 48747/23, que regulamenta a Política Estadual de Segurança de Barragens, instituída pela Lei nº 23.291/19, está em vigor.
Esse decreto define os critérios e os parâmetros para o cálculo da caução ambiental, bem como as modalidades de garantia para instituí-la.
Se você se interessou pelo tema do princípio da prevenção no direito ambiental, talvez você queira saber mais sobre essa inovação implementada. Recomendo que você leia o artigo Caução ambiental: o que você precisa saber sobre o Decreto Estadual MG 48747/23, aqui mesmo, no blog da Rocha Cerqueira.
O artigo explica em detalhes o que é; como é feito o cálculo do valor da caução ambiental; quais são as modalidades de garantia para a caução ambiental.
Seguimos juntos e até uma próxima!