Caução Ambiental no Decreto MG 48747/23

Caução ambiental: o que você precisa saber sobre o Decreto Estadual MG 48747/23

Sumário

Caução ambiental é destacada no Decreto Estadual MG 48747/23, regulando barragens em Minas Gerais com foco em segurança e recuperação ambiental.

As barragens são estruturas que acumulam ou armazenam água, rejeitos ou resíduos de atividades industriais ou de mineração. Elas podem representar riscos para o meio ambiente e para as comunidades próximas, caso ocorra algum rompimento, vazamento ou desativação inadequada.  

Por isso, é fundamental que os empreendedores responsáveis por essas barragens adotem medidas de segurança e de prevenção de acidentes, bem como de recuperação ambiental, caso haja algum dano. 

Neste artigo, vamos explicar o que é a caução ambiental, uma das medidas previstas na Política Estadual de Segurança de Barragens de Minas Gerais, instituída pela Lei nº 23.291, de 25 de fevereiro de 2019. Também vamos apresentar o Decreto Estadual nº 48.747, de 2 de janeiro de 2023, que regulamenta a caução ambiental e estabelece as regras para o seu cálculo, as modalidades de garantia aceitas, os requisitos para a sua aprovação e as hipóteses para a sua execução.  

Além disso, vamos contextualizar o decreto em relação à lei que o originou e às normas anteriores relativas à segurança de barragens. Por fim, vamos analisar a importância do decreto para os empreendimentos minerários e as perspectivas futuras para a regulamentação ambiental. Vamos lá?! 

O que é a caução ambiental? 

A caução ambiental é uma garantia financeira que o empreendedor deve apresentar ao órgão ambiental competente para obter o licenciamento ambiental de barragens que possam causar danos ao meio ambiente e à sociedade. A caução ambiental tem o objetivo de assegurar a recuperação ambiental na eventualidade de sinistro ou desativação da barragem, bem como o cumprimento das obrigações legais e das condicionantes do licenciamento. 

A caução ambiental é exigida para as barragens destinadas à acumulação ou à disposição final ou temporária de rejeitos e resíduos industriais ou de mineração e para as barragens de água ou líquidos associados a processos industriais ou de mineração, que apresentem, no mínimo, uma das seguintes características: 

  • altura do maciço, contada do ponto mais baixo da fundação à crista, maior ou igual a 10 metros; 
  • capacidade total do reservatório maior ou igual a 1 milhão de metros cúbicos; 
  • reservatório com resíduos perigosos; 
  • potencial de dano ambiental médio ou alto, conforme regulamento. 

A caução ambiental deve ser proposta pelo empreendedor na fase de licenciamento prévio e aprovada pelo órgão ambiental competente na fase de licenciamento de operação. A caução ambiental deve ser mantida e atualizada pelo empreendedor durante todo o período de operação da barragem, até a sua desativação e recuperação ambiental. 

Qual é o contexto legal do Decreto Estadual nº 48.747/23? 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 é um dos instrumentos normativos que regulamentam a Política Estadual de Segurança de Barragens de Minas Gerais, instituída pela Lei nº 23.291/19. Essa lei foi criada após o rompimento da barragem de rejeitos da Vale, em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019, que causou a morte de mais de 270 pessoas e graves impactos ambientais e sociais. 

A Lei nº 23.291/19 estabelece os princípios, os objetivos, as diretrizes, os instrumentos e as competências para a gestão da segurança de barragens no estado. A lei também define as responsabilidades dos empreendedores, dos órgãos ambientais e dos órgãos de proteção e defesa civil, bem como as sanções administrativas, civis e penais aplicáveis em caso de descumprimento das normas. 

A Lei nº 23.291/19 prevê a elaboração de três decretos para regulamentar os seguintes aspectos da política estadual de segurança de barragens: 

  • o Plano de Ação de Emergência (PAE), que é o documento que contém as ações e os procedimentos a serem adotados pelo empreendedor e pelos órgãos públicos em caso de situação de emergência em barragens; 
  • a caução ambiental, que é o tema deste artigo; 
  • a descaracterização das barragens construídas pelo método de alteamento a montante, que é o tipo de barragem considerado mais instável e que foi o responsável pelos rompimentos de Mariana, em 2015, e de Brumadinho, em 2019. 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 é o segundo a ser publicado, após o Decreto Estadual nº 48.140/21, que regulamentou o PAE em novembro de 2020. O decreto que regulamentará a descaracterização das barragens a montante ainda está em elaboração. 

A Lei nº 23.291/19 e o Decreto Estadual nº 48.747/23 se articulam com a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), estabelecida pela Lei Federal nº 12.334/10, e com as Políticas Nacional e Estadual de Meio Ambiente e de Proteção e Defesa Civil. Essas políticas visam garantir a segurança das barragens em todo o território nacional, bem como a prevenção e a mitigação dos danos ambientais e sociais decorrentes de acidentes com essas estruturas. 

Quais são as principais novidades do Decreto Estadual nº 48.747/23? 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 traz uma série de novidades em relação à caução ambiental, que podem ser resumidas nos seguintes pontos: 

  • detalha os parâmetros e a fórmula para o cálculo do valor da caução ambiental, que leva em conta o custo estimado da recuperação ambiental, o potencial de dano ambiental, o grau de dificuldade de recuperação e o fator de ajuste; 
  • estabelece as modalidades de garantia aceitas para a caução ambiental, que são: depósito em dinheiro, certificado de depósito bancário (CDB), fiança bancária e seguro-garantia; 
  • define os requisitos e as especificações de cada modalidade de garantia, bem como os critérios para a sua aprovação, renovação, substituição e liberação pelo órgão ambiental competente; 
  • determina as hipóteses para a execução da caução ambiental, que são: ocorrência de sinistro, desativação da barragem sem recuperação ambiental, inadimplemento das obrigações legais ou das condicionantes do licenciamento e não apresentação ou reprovação da proposta de caução; 
  • estipula os procedimentos e as responsabilidades em caso de execução da caução ambiental, que envolvem a notificação do empreendedor, a aplicação dos recursos da garantia, a prestação de contas e a responsabilização por eventuais danos remanescentes; 
  • dispõe sobre as regras de transição para os empreendimentos existentes, que devem apresentar a proposta de caução ambiental até 31 de dezembro de 2023, sob pena de suspensão ou cassação da licença ambiental. 

Como é feito o cálculo do valor da caução ambiental? 

O valor da caução ambiental é calculado com base na fórmula do Anexo I do decreto, que considera os seguintes parâmetros: 

  • área do reservatório da barragem, contemplando a área ocupada pelo rejeito ou pelo resíduo e água, em metros quadrados; (a área a ser considerada será aquela ocupada pela projeção superior do material armazenado, sólido e líquido, considerando o enchimento do reservatório até a soleira do extravasor operacional da barragem).
  • classificação e finalidade da barragem, nos termos do Decreto nº 48.140, de 25 de fevereiro de 2021;
  • custo estimado dos projetos de descaracterização de barragens por área. 

Em dezembro de 2023, também foi publicada a Lei 14750/2023 que dispõe sobre a gestão de acidentes e desastres induzidos por ação humana.

Rocha Cerqueira
Rocha Cerqueira

Em seu art. 12-A inciso VII, essa lei menciona que as empresas devem ter provimento de recursos necessários à garantia de segurança do empreendimento ou da atividade e reparação de danos à vida humana, ao meio ambiente e ao patrimônio público, em caso de acidente ou desastre.

Ela não especifica que tal provimento seja por caução ambiental, mas há uma relação entre estas duas previsões legais, afinal a caução definida na legislação de Minas Gerais é uma forma de resguardar o atendimento financeiro aos riscos do art. 12-A. 

Quais são as modalidades de garantia para a caução ambiental? 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 prevê quatro modalidades de garantia que podem ser utilizadas pelo empreendedor para apresentar a caução ambiental ao órgão ambiental competente. São elas: 

  • Depósito em dinheiro, que consiste na transferência de recursos financeiros para uma conta bancária específica do Fundo de Recuperação, Proteção e Desenvolvimento Sustentável das Bacias Hidrográficas do Estado de Minas Gerais (FHIDRO). O depósito em dinheiro deve ser feito em moeda nacional, corrigido monetariamente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e remunerado pela taxa referencial (TR). 
  • Certificado de depósito bancário (CDB), que consiste na emissão de um título de renda fixa por uma instituição financeira autorizada pelo Banco Central do Brasil, em favor do órgão ambiental competente. O CDB deve ter liquidez diária, prazo de vencimento compatível com o período de operação da barragem, valor nominal atualizado pelo IPCA e taxa de remuneração igual ou superior à taxa Selic. 
  • Fiança bancária, que consiste na emissão de uma carta de fiança por uma instituição financeira autorizada pelo Banco Central do Brasil, em favor do órgão ambiental competente. A fiança bancária deve ter prazo de validade indeterminado, valor nominal atualizado pelo IPCA, cláusula de renúncia ao benefício de ordem e cláusula de pagamento imediato e incondicional em caso de execução da caução ambiental. 
  • Seguro-garantia, que consiste na emissão de uma apólice de seguro por uma seguradora autorizada pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), em favor do órgão ambiental competente. O seguro-garantia deve ter prazo de validade indeterminado, valor nominal atualizado pelo IPCA, cláusula de pagamento imediato e incondicional em caso de execução da caução ambiental e cláusula de renovação automática. 

O empreendedor pode optar por uma ou mais modalidades de garantia, desde que o valor total da caução ambiental seja integralmente coberto. O empreendedor também pode solicitar a substituição da modalidade de garantia, mediante aprovação do órgão ambiental competente. O órgão ambiental competente pode recusar ou rejeitar a proposta de caução ambiental, caso a modalidade de garantia escolhida pelo empreendedor não atenda aos requisitos e às especificações do decreto. 

Quando ocorre a execução da caução ambiental? 

A execução da caução ambiental é a utilização dos recursos da garantia financeira apresentada pelo empreendedor para realizar a recuperação ambiental da área afetada pela barragem, em caso de sinistro ou de desativação da barragem sem a devida recuperação. 

A execução da caução ambiental também pode ocorrer em caso de inadimplemento das obrigações legais ou das condicionantes do licenciamento ambiental pelo empreendedor, ou em caso de não apresentação ou de reprovação da proposta de caução ambiental pelo órgão ambiental competente. 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 estabelece os procedimentos e as responsabilidades em caso de execução da caução ambiental, que são os seguintes: 

  • O órgão ambiental competente deve notificar o empreendedor sobre a ocorrência de uma das hipóteses de execução da caução ambiental, concedendo-lhe um prazo de 10 dias para apresentar defesa ou manifestação. 
  • Após o prazo de defesa ou manifestação, o órgão ambiental competente deve decidir sobre a execução da caução ambiental, considerando os argumentos e as provas apresentados pelo empreendedor, bem como os demais elementos técnicos e jurídicos pertinentes ao caso. 
  • Em caso de decisão favorável à execução da caução ambiental, o órgão ambiental competente deve comunicar a decisão ao empreendedor e à instituição financeira ou à seguradora responsável pela garantia, solicitando a liberação imediata e incondicional dos recursos da caução ambiental. 
  • Os recursos da caução ambiental devem ser depositados em uma conta bancária específica do FHIDRO, destinada exclusivamente à recuperação ambiental da área afetada pela barragem. 
  • O órgão ambiental competente deve aplicar os recursos da caução ambiental na recuperação ambiental da área afetada pela barragem, podendo contratar serviços técnicos especializados, adquirir materiais e equipamentos, realizar obras e intervenções, entre outras ações necessárias. 
  • O órgão ambiental competente deve prestar contas da aplicação dos recursos da caução ambiental ao Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM), ao Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) e ao Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG), conforme as normas vigentes. 
  • A execução da caução ambiental não exime o empreendedor da responsabilidade pelos danos ambientais e sociais causados pela barragem, nem impede a aplicação de outras sanções administrativas, civis ou penais cabíveis. Caso os recursos da caução ambiental sejam insuficientes para a recuperação ambiental da área afetada pela barragem, o empreendedor deve arcar com os custos remanescentes, sob pena de responsabilização. 

Qual é a importância do Decreto Estadual nº 48.747/23 para os empreendimentos minerários? 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 é uma norma de grande relevância para os empreendimentos minerários que possuem ou pretendem implantar barragens no estado de Minas Gerais. Isso porque o decreto impõe novas exigências e responsabilidades para os empreendedores, que devem apresentar uma garantia financeira robusta e adequada à realidade e aos riscos de cada barragem. 

O decreto também representa um avanço para a segurança ambiental e para a prevenção de acidentes com barragens, que têm causado enormes prejuízos ambientais e sociais no estado e no país. A caução ambiental visa garantir que, em caso de sinistro ou de desativação da barragem, haja recursos disponíveis para a recuperação ambiental da área afetada, evitando ou minimizando os danos ao meio ambiente e à sociedade. 

Além disso, o decreto incentiva os empreendedores a adotarem boas práticas de gestão ambiental e de segurança de barragens, uma vez que o valor da caução ambiental pode ser reduzido ou aumentado de acordo com o fator de ajuste, que leva em conta o desempenho ambiental do empreendimento. Assim, o decreto estimula a melhoria contínua e a busca pela excelência na gestão das barragens. 

Quais são as perspectivas futuras para a regulamentação ambiental? 

O Decreto Estadual nº 48.747/23 é um dos instrumentos normativos que regulamentam a Política Estadual de Segurança de Barragens de Minas Gerais, instituída pela Lei nº 23.291/19. Essa política é uma resposta do estado aos graves acidentes ocorridos com barragens de rejeitos de mineração que evidenciaram a necessidade de aprimorar a legislação e a fiscalização sobre essas estruturas. 

A política estadual de segurança de barragens se articula com a política nacional de segurança de barragens, estabelecida pela Lei Federal nº 12.334/10, que também vem sendo atualizada e complementada por novas normas e regulamentos. Além disso, a política estadual e a política nacional se integram com as políticas nacional e estadual de meio ambiente e de proteção e defesa civil, que visam garantir a preservação dos recursos naturais e a proteção das populações vulneráveis. 

As perspectivas futuras para a regulamentação ambiental são de que haja uma maior harmonização e integração entre as normas federais, estaduais e municipais, bem como entre os órgãos ambientais, os órgãos de proteção e defesa civil, os órgãos de fiscalização e controle, os empreendedores, as entidades de classe, as organizações da sociedade civil e as comunidades afetadas. Também se espera que haja uma maior participação e transparência nos processos de licenciamento, monitoramento, fiscalização e recuperação ambiental, bem como uma maior responsabilização e punição dos infratores. 

A regulamentação ambiental é um instrumento essencial para a promoção do desenvolvimento sustentável, que concilia o crescimento econômico, a conservação ambiental e a justiça social. Por isso, é importante que todos os envolvidos na gestão das barragens estejam atentos e comprometidos com o cumprimento das normas e com a melhoria da segurança e da qualidade ambiental. 

Palavras finais 

Esperamos que este artigo tenha sido útil e esclarecedor para você. Se gostou deste artigo, convidamos você a ler outro artigo que escrevemos sobre Responsabilidade Social e Barragens: novas obrigações legais, que trata das implicações das Leis 14.750 e 14.755, que sinalizam o protagonismo para a responsabilidade social. Nesse artigo, você vai entender os novos requisitos legais e as medidas preventivas para empreendedores, além das obrigações das organizações diante dessas normas. 

Se você tiver alguma dúvida, sugestão ou comentário sobre este artigo ou sobre o Decreto Estadual nº 48.747/23, por favor, entre em contato conosco. Estamos à disposição! 

Natália Cardoso Marra
Natália Marra

Advogada Associada da Rocha Cerqueira; Doutora em Ciências Sociais pela PUC Minas; Mestre em Gestão Social e Desenvolvimento Local pelo Centro Universitário UNA; Pós-graduada em Direito Ambiental pela Faculdade Gama Filho; Pós-graduada em Administração Pública e Gestão Urbana pela IEC/PUC Minas; Pós-graduada em Justiça Restaurativa e Práticas Circulares pela IEC/PUC Minas; Graduada em Direito pela Milton Campos. Professora universitária com mais de 14 anos de experiência no mercado. Toda a trajetória profissional é engajada com a participação social e o envolvimento com instituições do terceiro setor voltados para os direitos humanos e a educação. Tem experiência em mobilização social e atuação com comunidades. OAB MG 117.356

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OAB MG 3.057

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